sábado, 6 de março de 2010

consumo

Cheguei. Ele não sorriu. Desceu do carro e entrou no meu. Avancei para lhe dar um beijo (humilde) no rosto. Indicou o caminho de sua casa por ruas erradas dizendo que eu tirava sua concentração.

Chegamos. O pitbull também ignorou a minha presença (pelo menos não havia sido ele quem me convidara para ir até ali).

Andava pela casa à minha frente como se eu morasse no mesmo lugar. Me senti como um cão abandonado que segue o pretendido dono, pidonho.

Ligou o computador. Teclava nervosamente. Sentada à beira da cama, via sua cabeça, seus dedos, atrás de mim, projetados em silhueta no vértice da parede, enormes, Nosferatu.

Vou embora.

Por quê?

Por que me convidou para vir se não queria que isso acontecesse? As coisas são simples, ninguém te obrigou a querer a minha presença.

É que eu estou ocupado, tenho muita coisa pra fazer antes de viajar. Desculpa.

Vou embora.

Por quê?

Me desculpa, mas eu não aguento (nem mereço) tanta indiferença.

Ta certo...

Desespero internalizado. Esse era o medo que me fizera não dizer nada. Fiquei ali, à espera, pensando em nunca mais fazer o mesmo, me afundando, me dispondo o quanto não devia, por mim, por ele. Diferentes histórias, expectativas, aconteciam simultaneamente. Um achando que o outro não percebia suas intenções, o outro, pensando em mostrá-las, desnudá-las o quanto as pudesse enxergar.

Não fujo da verdade. Quero que me jogue na cara, me esbofeteie e cuspa.  É da sua saliva que eu tiro a minha força. Dessa vez – mais uma delas – não foi. Esperei a sua disposição em vir se deitar. Nossas palavras se cruzavam, ritmadas, mas, por fim, consumidos, nos distanciamos. Eu perfurada, vazada, tangida. Ele fechado, lacrado, lavado, incólume.

2 comentários:

Unknown disse...

Bonita a imagem do nosferatu...hehe parece estranho mas foi o que achei.

Umbigo Meu disse...

Rápido e bonito!
Gostei!